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Em 10 dias, seis operações policiais e milhares de vidas impactadas na Maré

Registro durante a Marcha Contra a Violência na Maré, em maio de 2017. | Foto Elisângela Leite/Redes da Maré
Registro durante a Marcha Contra a Violência na Maré, em maio de 2017. | Foto Elisângela Leite/Redes da Maré

Na última quarta-feira (18), vivenciamos o sexto dia de operações policiais dentro de um intervalo de 10 dias nas favelas da Maré. Realizadas pelo governo do estado do Rio de Janeiro, as operações geram impacto na vida de milhares de pessoas, que se vêem impossibilitadas de dar seguimento às suas atividades cotidianas em decorrência do medo gerado pela violência armada.

Por volta das 5h da manhã desta quarta-feira, moradores do Parque União, Rubens Vaz e Nova Holanda relataram a presença de policiais e carros blindados circulando pelo território, além dos casos de violações de direitos. Além do medo, o fechamento de comércios, equipamentos públicos e organizações comunitárias prejudica muito o acesso da população maréense a serviços essenciais. 

O esporte também perde essa luta. Por dia, o fechamento da Academia da Luta Pela Paz afeta cerca de 860 atletas que têm seus treinos cancelados, além das 90 crianças participantes das atividades socioesportivas que acontecem em parceria com a 4ª Corregedoria Regional de Educação (CRE). No total, 1.736 participantes ficaram sem acesso a atividades de esporte e desenvolvimento pessoal nesses dias e 145 atividades foram suspensas. Por dia, 70 alunos não puderam participar das atividades educativas de reforço escolar e em média, 20 pessoas – entre jovens e responsáveis – não conseguiram receber encaminhamento para o mercado de trabalho. O acesso das famílias mareenses a acompanhamento psicossocial também ficou comprometido, com a suspensão de 61 atendimentos que seriam realizados pela nossa equipe de suporte social nos seis dias de operações.

Diante do contexto de execução e corroboração da mídia a ofensivas militares constantes nas favelas cariocas, a Luta Pela Paz relembra ao Estado a sua responsabilidade com a garantia de direitos dos moradores e moradoras de periferias. Favela também é cidade e exige ser tratada com o mesmo respeito à legalidade que é exercida no asfalto. Nesse sentido, cabe lembrar que por meio da ADPF das Favelas (ADPF 635), o Supremo Tribunal Federal (STF) ordenou ao Estado do Rio que se comprometa com a redução da letalidade policial em favelas, aderindo às determinações de uso de câmera nos uniformes policiais, respeito ao horário escolar e presença de ambulâncias durante as operações. No entanto, o que se vê são práticas de violência verbal, patrimonial e letal ocorrendo nos últimos dias na Maré.

A Luta pela Paz começou seus trabalhos nos anos 2000 como uma alternativa de minimização do impacto da violência armada no território por meio do esporte, com boxe e outras artes marciais, além de educação, empregabilidade, liderança juvenil e suporte social. Nossa experiência de mais de 20 anos na Maré e outros territórios pelo Brasil nos ensina que a violência, como fenômeno complexo que é, demanda uma política de segurança pública baseada em evidências e inteligência para ser enfrentada. Isso inclui políticas integradas de prevenção à violência, redução de vulnerabilidades e preservação da vida, a fim de garantir direitos e corrigir desigualdades.

Seguimos na luta contra um sistema que coloca pessoas faveladas na linha de tiro, reproduzindo violências sistêmicas e estruturais em nome de uma guerra que já se provou falida há muitos anos. Trabalhamos para que crianças, adolescentes e jovens possam desenvolver seu potencial ao máximo, e entendemos que um Estado que compartilha do mesmo objetivo deve se comprometer com uma política de segurança pública que respeite e garanta direitos, dentro e fora das favelas.

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